Para o passageiro, os hábitos também se modificaram. «Antigamente as pessoas vestiam-se para viajar. Havia um ritual, sobretudo na primeira classe. Não se ia para o avião de qualquer maneira. Havia muito menos gente a voar. Depois democratizou-se», atira Teresa Monteiro, que deixou a empresa há 15 anos.
Hoje o à-vontade é maior. «Antes, o público não estava habituado a voar e via-nos com distância. Depois, passou a ver-nos como companheiros de viagem», concorda Georges Jeunehomme. E recorda até três episódios que se passaram com personalidades célebres. Marcelo Caetano reagiu bem quando o actual director de pessoal de bordo lhe disse que, por estar escuro no avião, tinham confundido o seu colete com um pano, usando-o para limpar os tabuleiros. António Champalimaud, um dos homens mais ricos do país, gostava de dar conselhos sobre investimentos. E Amália, que tinha pavor de voar, pedia que alguém lhe fizesse companhia durante o voo. Bebericava champanhe para acalmar.
«Havia passageiros que nos ofereciam sapatos ou queriam que fôssemos aos restaurantes deles», diz Jeunehomme. «Convidavam-nos para ir dormir a casa deles e íamos com frequência», recorda Jorge Claudino, outro ex-comissário, agora chefe de cabine. Com 65 anos, 40 de serviço, aponta a ocasião em que, depois de passar uma noite inteira a conversar com um passageiro a caminho de Moçambique, acabou por ser desafiado a ir conhecer a sua quinta. Teve direito a passeio de jipe, exibição de danças africanas, jantar e pernoita.
Em África, a proximidade entre tripulação e viajantes estreitou-se ainda mais durante a ponte aérea, a seguir à revolução dos cravos, quando muitos portugueses quiseram deixar o Ultramar e regressar a Lisboa. «Cheguei a fazer voos para Nova Lisboa [Huambo, Angola] em que o avião tinha de fazer uma descida quase a pique para o aeroporto porque havia trocas de tiros. Chegávamos a embarcar passageiros completamente às escuras. Vinham de longe, aflitos», descreve.
Com capacidade para 385 pessoas, 16 no segundo andar, o Boeing 747 até trazia gente na casa de banho, confidencia Teresa Monteiro. Era «uma época muito dura» para quem vinha mas também para as tripulações que iam e vinham sem descanso.
«Numa noite, no meu voo para Luanda, quando estava sobre a Nigéria, havia mais seis aviões nossos voando nessa região de África, uns saídos de Lisboa, outros voltando», relembra o comandante Graça. Em três meses, a TAP trouxe mais de 150 mil pessoas de Luanda, contabiliza.
A proibição de fumar nos aviões – em meados de 90 a TAP introduz os voos azuis, livres de fumo – e os cuidados com a segurança, apertados depois do 11 de Setembro de 2001, foram outras das grandes alterações vividas na aviação.
Neste mercado, sopraram ventos de turbulência com a chegada das companhias low cost, as flutuações do preço do petróleo e as crises económicas. Mas também de evolução, com a inovação tecnológica, a modernização dos aviões ou a internet.
Tal como a bordo dos seus aviões houve bons e maus momentos, também o percurso da maior companhia aérea nacional passou por altos e baixos. Para a História ficam o transporte de Papas, a celebração em pleno ar do Nobel para José Saramago e pelo menos quatro nascimentos. O primeiro, de uma menina, aconteceu em Fevereiro de 1969, num voo de Luanda para Lisboa. E o último foi registado em 1986, a caminho de Nova Iorque. Mas ninguém esquece o único acidente, na aterragem de um Boeing no Funchal, em 1977. Balanço: 131 vítimas mortais.